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sábado, 24 de setembro de 2011

PLANETA DOS MACACOS: A Origem (2011)



Hollywood precisa de ideias.
A safra de refilmagens, sequels, prequels, etc, tem demonstrado que a alternativa de recorrer ao que alguma vez já conquistou seu espaço na preferência do público é cada vez mais uma forma de justificar investimento milionário em algum novo projeto.

Se já funcionou antes, é só filmar parecido, atualizando os efeitos especiais.
Ao menos foi nisso que Tim Burton acreditou quando ousou reiniciar um cânone do cinema sci-fi.
No entanto, “O Planeta dos Macacos” (2001) dirigido por ele não teve a recepção por ele esperada.
Se concentrar apenas em renovar efeitos e maquiagem é coisa de principiante sem visão, e por isso ele pagou o preço.
O que realmente importava era a parte difícil, que ele convenientemente preferiu fingir que não interessava.
Azar o nosso, e da franquia que permaneceu no limbo até 2011, um novo capítulo da cinessérie tentaria resgatar a saga.


Porém, se o que se esperava era o retorno na forma de um blockbuster convencional, o filme não era divulgado da maneira típica em se tratando de um arrasa-quarteirão.
O trabalho do diretor Rupert Wyatt trazia um certo algo a mais nos trailers e imagens disponibilizadas, parecendo correto esperar que fosse além da pirotecnia óbvia.
Isso, é claro, não era garantia de que seria um bom movie, mas ao menos estaria longe da estratégia Burtoniana de caprichar apenas em visual (o que seria visto novamente em Alice no País das Maravilhas).

O andamento do começo deste “Planeta dos Macacos: A Origem” mantém esse ar levemente inusitado, ainda que uma certa obviedade ainda o impeça, ao menos nesses momentos iniciais, de ser mais envolvente (qualquer um sabe o desfecho da fuga do chimpanzé durante a palestra de James Franco).
Mas o roteiro vai progredindo rápido, e se a visão dos testes com animais já não chega a ser algo que carregue tamanho efeito na platéia acostumada com as barbáries dos noticiários, basta surgir em cena o chimpanzé Cesar para que o longa-metragem mude radicalmente.
Essas cadências pontuando o enredo, aliás, são característica essencial para o roteiro escrito por Amanda Silver e Rick Jaffa.
Percebe-se desde o primeiro close no olhar de um símio, que eles serão apresentados de maneira diferenciada, e quando o foco passa a ser Cesar em seu novo núcleo familiar isso é concretizado.


É parte do questionamento filosófico da trama essa humanização do chimpanzé magistralmente interpretado por Andy Serkis.
Parece que o filme permanecia comum até a chegada de seu verdadeiro protagonista, e bastam poucos minutos para que Serkis traduza e arrebate o espectador com as dúvidas e inquietações de Cesar, que mesmo não sendo expressas em palavras, irão estar nos olhares e na linguagem corporal que o ator utiliza para compor seu novo personagem.
As grades que separam o chimpanzé da vida pela qual seu instinto clama, são simples janelas e convenções sociais humanas, ainda que ele tenha o otimismo de enxergar sempre através delas, e não simplesmente aceitar as limitações que lhe são impostas.
A revolução que a sinopse aponta é uma mera questão de tempo.
E tempo é algo que o diretor Wyatt parece disposto a utilizar muito bem.

A história se desenrola com o transcorrer do crescimento e amadurecimento do símio, até que ele enfim conheça as características humanas das quais seu pai adotivo sempre quis protegê-lo.
O drama familiar que envolve essa parte da metragem vai chegar ao fim, do mesmo modo que outra etapa do aprendizado de Cesar.
E nem mesmo sua inteligência fora do comum é capaz de compreender os porquês da insistência humana em forjar mentiras, em criar grades e coleiras que por alguma razão desconhecida são chamadas de liberdade.
Sem perder o ritmo da narrativa, ou desperdiçar atenção com o envolvimento romântico entre o cientista Will (James Franco), e a veterinária Caroline (Freida Pinto, de “Quem Quer Ser Um Milionário”), Wyatt parte para um asfixiante clima de filme de prisão, ao mesmo tempo em que dialoga com o melhor do cinema de máfia.

De “O Poderoso Chefão” a “Scarface”, passando por “Alcatraz”, tudo sem isolar os não apreciadores de um ou outro gênero cinematográfico, afinal, o elo que une cada segmento é o seu protagonista, e Andy Serkis jamais deixa de ser verossímil e extraordinário na pele do cada vez mais assustadoramente humano Cesar.
O período aprisionado será determinante para o seu aprendizado.
As feras criadas pelos próprios seres humanos ficam mais inteligentes graças a uma droga criada para reverter os efeitos do Mal de Alzheimer, e para encher os bolsos de seus desenvolvedores, e enquanto os símios preparam sua ascensão, acompanhamos no indicado ao Oscar pelo filme 127 Horas”, James Franco a fragilidade da tragédia da humanidade.
Cada vez mais ele se afasta de Cesar, e a distância entre os dois é peça do processo de construção de identidade que acarretará no surgimento de uma nova espécie dominante no planeta.

 

Vendo bem superficialmente, é isso o que o roteiro tem a oferecer, e é fato que é prato cheio para discussões antropológicas eternas.
Durante a sessão, lembrei facilmente de um clássico de tema similar.
No genial “Os Pássaros”, de Alfred Hitchcock, a revolta da natureza é expressa pela investida dos animais alados contra os humanos, missão que em 2011 fica a cargo do bando de primatas que decidem que não vão mais ser subjugados, e que as jaulas construídas pelos homens não devem ser aceitas como um habitat natural.
Partindo disso, cabe a Rupert Wyatt filmar cada nova sequência com a competência e maestria que merece, afinal, enquanto em outros casos é exigido do diretor compensar a preguiça do enredo, em “Planeta dos Macacos: A Origem” resta a ele elaborar a imagem que ficará gravada na memória do espectador.
E é exatamente isso o que ele faz.
Contando com efeitos especiais extraordinários, e um vasto arsenal de ideias, o cineasta fez além do que era imaginado.
Dificilmente alguém esquecerá tão cedo a maneira com que Cesar conquista a confiança de seus colegas de cárcere, ou um mero movimento de câmera acompanhando-o subir em uma árvore, a caracterização espetacular de cada símio coadjuvante, ou... a luta na ponte.
É.



Será absolutamente impossível esquecer o inacreditável embate na ponte, que terá sem dúvida, alguns dos momentos mais intensos e emocionantes que o cinema irá lhe proporcionar em 2011.
E isso poucos meses depois do lançamento do irrepreensível “X-Men: Primeira Classe (2011), o qual apresenta elementos bastante semelhantes a este seu rival no posto de melhor filme de ação da temporada até agora.
A coragem ao mesclar o forte e incisivo teor crítico, visual elegante, e o desinteresse pelas fórmulas prontas que alimentam séries adolescentes de início, meio e fim conhecidos, é a força motriz para que um roteiro apenas seja filmado quando for para buscar levar ao público um produto final de trama imprevisível, ainda que de alto risco quanto ao seu faturamento.

Cada momento é repleto de símbolos, pequenos detalhes e referências ao contexto da antiga série no cinema, nesse filme que consagra Andy Serkis no papel do líder deste selvagem bando em fuga para qualquer lugar em que os humanos não tenham chegado para erguer paredes e regras de interesse moral questionável.
E pensar que tudo ocorre simplesmente porque aqueles caras arrogantes de uniforme não entendem que o implacável exército que Cesar reuniu não quer destruir as bobagens que a sociedade acredita ter tamanho valor.


Em épocas de efeitos especiais desperdiçados, e de guerreiros de Pandora xerocando o discurso pronto de tantos outros filmes, é gratificante poder assistir uma prequel que não apenas não está presa ao material original, mas também se afasta inteligentemente para o surgimento de uma mitologia nova e audaz, em uma franquia que se reencontrou para redefinir a ficção científica para uma nova geração.
Se os envolvidos no projeto terão competência para manter o altíssimo nível dessa primeira parte no que virá a seguir, só o futuro dirá.
Porém, independente de continuações, e interesses de produtores por multiplicar a bilheteria, a meu ver a história já está pronta, e se fosse pra terminar por aqui, já seria excelente.
Todas as perguntas que restaram no ar apenas fazem parte do poder de um grande filme em nos fazer questionar, e repensar se a ficção científica está realmente tão distante da nossa realidade.
A cena pós-créditos que o diga.

“Planeta dos Macacos: A Origem” é simplesmente uma jornada para fugir das amarras.
Por liberdade e nada mais.


Quanto vale: 


Planeta dos Macacos: A Origem
(Rise Of The Planet Of The Apes)
Direção: Rupert Wyatt
Duração: 105 minutos
Ano de produção: 2011
Gênero: Ficção Científica / Ação

4 comentários:

Guilherme Hollweg disse...

Genial mesmo.
Belíssima crítica, concordo com absloutamente tudo.
Melhor filme de 2011 até agora.
Abraço,

Marcel Ibaldo disse...

Mesmo que seja difícil, espero que ele seja superado ainda em 2011.
Ia ser incrível conferir algum filme ainda melhor no cinema.

Aguardemos.

Cruzaltino disse...

E aí, marcel

Bah, muito legal o teu blog. Estávamos com uma vontade de assistir o Lanterna Verde e tua crítica me desanimou um pouco (embora não tivéssemos grandes expectativas) rsrsrsrss

Estamos seguindo o teu blog!!!
Um abração
Henrique Madeira e Greice Pozzatto

Marcel Ibaldo disse...

Henrique e Greice.
Sinto desapontá-los, mas verdade sendo dita, a impressão frustrante dos trailers do Lanterna Verde foi potencializada no longa-metragem.

Assistam em tela menor, e nada será perdido (a não ser o tempo que poderia ser utilizado em outra coisa útil).

Valeu pela visita, pelo comentário, e por estarem seguindo o blog!