E já faz um tempão que o diretor David Fincher surpreendeu o mundo com seu inquestionável thriller de suspense absoluto, “Seven: Os Sete Crimes Capitais”.
De lá pra cá ele não se acomodou com o status adquirido quase imediatamente de grande diretor em Hollywood. Até então ele era visto muito na condição de promissor cineasta, e isso não era o bastante, obviamente.
Seus filmes seguintes demonstraram a inquietação do cara em tentar trilhar os mais diferentes caminhos que sua carreira pudesse, isso sem hesitar ingressar em algum projeto complexo e de retorno financeiro não tão fácil.
Mas ele não estava ligando pra nada disso. E “O Clube da Luta” é uma prova clara dessa afirmação.
A busca por consolidação de uma filmografia imprevisível sempre o aproximou de assuntos com os quais poucos ousariam trabalhar, e logo chegou até ele a oportunidade de transpor para a telona um episódio marcante da História recente.
Uma daquelas histórias que a memória efêmera da população tenderia a negligenciar em prol de algum novo assunto do momento, mas que teria a oportunidade de ser imortalizada com o poder marcante da linguagem do cinema.
A sinopse em si não é algo que soe revolucionário. Pra perceber que essa afirmação está correta, basta imaginar o mesmo roteiro se fosse dirigido por outro cineasta, algum desses que filma draminhas familiares hoje em dia. Não valeria investir duas horas pra assistir.
Porém, a aceitação por parte de Fincher em realizá-lo muda isso completamente.
A elaboração de sua instigante versão da trajetória de Mark Zuckerberg (Jesse Eisenberg, concorrendo ao Oscar em 2011), criador do Facebook, não parte de um mistério a solucionar, ou de uma ou outra cena de ação que o público viu no trailer e que tenha despertado sua expectativa.
O relato é muito mais pessoal, próximo dos protagonistas, e aparentemente distante do que realizaram.
Até o fim da metragem a presença dos personagens não é apagada pela tragédia ou glória de seus feitos. Permanecem sendo as peças fundamentais da trama, Mark, Saverin (Andrew Garfield), Sean Parker (Justin Timberlake), os Irmãos Winklevoss (Armie Hammer), etc...
Falando assim, tende a ocorrer o que aflige o público médio, ao ler um resumo de filme que não diga: “e só eles poderão salvar o mundo dessa terrível ameaça”, pode parecer pouco interessante acompanhar o desenrolar dos eventos. O que seria um engano ao menos monumental.
Fincher tem afirmado sua carreira com o esmero na parte técnica andando em equilíbrio com sua inventividade e filosofia particular de enxergar nas pessoas retratadas o que há de mais importante, e por mais que os fãs de pirotecnia possam lamentar a ausência de qualquer indício de explosões ou sequências de ação, é impossível deixar de reconhecer o quanto é envolvente acompanhar uma simples história a respeito de uns caras que decidiram criar um sitezinho, e que certo dia se desentenderam provocando um processo judicial em que uns míseros bilhões de dólares estão em jogo.
De narrativa inteligente e de um singular dinamismo, A Rede Social prossegue fiel à ideia de simplesmente acompanhar seu competente elenco ao longo do caminho, sem deixar necessariamente vilões ou heróis definidos.
E em se tratando dos personagens, o que os difere é principalmente a perspectiva que cada um tinha a respeito do potencial da obra que estavam ajudando a criar. O Facebook permanece na forma de um desejo utópico dos responsáveis por o tornarem real, afinal, um dos pontos centrais do conflito entre eles pode ser visto como um embate entre o capitalismo e a simples liberdade de relacionar-se com outras pessoas.
A visão de Zuckerberg diverge dos demais por ser alicerçada no pensamento de que a necessidade de investidores é algo a ser deixado em segundo plano, de certo modo se assemelhando ao modo de ver de um artista em relação ao seu próprio trabalho. Não necessariamente importa se haverão fortunas envolvidas, desde que sua obra possa alcançar de algum modo o grande público. Saverin vê de maneira diferente, afinal é ele que assina os cheques e paga as contas.
Na condição daquele que primeiro vislumbrou esse universo de possibilidades em sua mente, Zuckerberg passa a buscar esse propósito da maneira que lhe for possível, ainda que ao custo de sacrifícios, e ainda que estivesse criando uma ferramenta de relacionamento que não poderia auxiliá-lo a salvar os seus próprios, despedaçados em prol de sua conquista particular. E se o seu amigo Eduardo Saverin representa um empecilho, com sua incapacidade de enxergar o Facebook do mesmo modo que ele, não há escolha a não ser tirá-lo do caminho, e mesmo que os outros possam considerar o modo como isso ocorre uma traição, Saverin deveria compreendê-lo, afinal, ele é seu amigo, não é?
Enquanto isso, Fincher não está no cargo de diretor para atuar de juiz a decretar uma sentença. Ele apenas expõe as informações que trouxe do livro “The Accidental Billionaires”, de Ben Mezrich, e deixa ao espectador que saia da sessão afirmando quem ele acredita que é o certo ou errado, mesmo que não haja especificamente nem um, nem outro.
Uma história comum sobre dois amigos que criam um site, uma quase dramatúrgica tragédia moderna, e com certeza um grande filme.
A Rede Social
(The Social Network)
Direção: David Fincher
Duração: 120 minutos
Ano de produção: 2010
Gênero: Drama
6 comentários:
A atuação do elenco é primorosa e a direção de Fincher é firme. Porém não gostei da narrativa. Para mim o filme pareceu durar três horas.
Pelo estardalhaço que a crítica especializada está fazendo, eu esperava mais!!
Grande filme! Mais uma vez David Fincher acertou em cheio.
Curti pacas.
Uma grande obra. Um bom roteiro, bem conduzido, uma bela narrativa, diálogos geniais, atuação do elenco memorável e principalmente um desenrolar de trama fantástico.
Não assisti ao Discuro do Rei nem a Mihas Mães, meu pai, mas em minha opinião, A Rede Scocial merece o Oscar de melhor filme de 2010.
Valeu a análise.
Guiga Hollweg
Pra falar a verdade, no início eu até achei que o filme poderia ser um pouco cansativo, afinal, a verborragia do Mark na cena inicial é algo beirando o insuportável, e aquela guria até que tolerou muito.
Mas logo o enredo foi estabelecido e contado com a conhecida competência do David Fincher, e as duas horas passaram num instante. Poderiam até ser três horas, e ia ser um baita filme de qualquer jeito, na minha opinião.
A briga do Oscar está realmente entre "O Discurso do Rei", e "A Rede Social", mas apesar de haver um favoritismo dominando as apostas, as vezes o Academy Awards surpreende.
Aguardemos.
Valeu pelos comentários.
Seria legal se a Origem ganhasse Oscar, mas acho difícil os caras premiarem um roteiro viajante pra caralhu.
Provavelmente, "A Origem" vai ficar com algum dos prêmios técnicos, e quem sabe um de roteiro, e olhe lá.
Conforme mencionado anteriormente no blog, a concorrência é o grande problema pro filme do Christopher Nolan, que fez um bom filme de ação, mas pra ganhar o Oscar vai precisar de bem mais do que isso.
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