O que transforma um reles filme em uma franquia multimilionária de sucesso, capaz de influenciar e interagir com a cultura pop mundial nas mais diversas mídias?
Seria uma necessidade de um contexto social, que é suprida por uma série de ideias e elementos presentes em uma determinada obra cinematográfica?
Ou talvez a capacidade de criar um universo tão interessante em suas regras particulares que provoca no espectador uma necessidade de acompanhar os personagens em novas jornadas nas telas?
Seja qual for a resposta, Jon Favreau deve saber.
Afinal, antes de 2008 o herói Iron Man era conhecido especialmente pelos fãs de quadrinhos, preso a um público segmentado e sem conseguir burlar as amarras do meio 2D em que foi criado.
Parecia difícil a transição para as telas, semelhante ao Hulk, ou conseguir tamanha identificação com o grande público do modo que o Homem Aranha foi capaz.
Porém, depois de 2008 isso mudou completamente.
Quase de maneira despretensiosa o filme de 2008 criou uma indescritível expectativa quanto à sequência, e o inusitado herói finalmente tornava-se unânime como uma das principais apostas de blockbuster da temporada.
Uma receita básica quando se fala em sequels, é que os filmes devem aumentar a escala, agregando novos elementos aos já existentes nos filmes anteriores. O diretor Jon Favreau com certeza conhece bem essa receita.
Por também possuir uma carreira na função de ator, o cineasta sabe muito bem que não são necessários meramente efeitos especiais para construir uma grande história. E às vezes nem mesmo uma grande história para criar um bom filme. Um personagem cativante já é o suficiente. Foi isso que aconteceu no primeiro longa-metragem, mas seria arriscado depender apenas disso uma segunda vez.
Sendo assim, qual a principal diferença entre Iron Man (2008) e Iron Man 2 (2010)?
A resposta é simples e complexa: roteiro.
Poucas vezes um blockbuster de ação soube aliar um timing tão apurado nos diálogos com um senso de humor igualmente eficaz. O elenco, em grande parte o mesmo do movie anterior, responde a isso de maneira positiva, interagindo em cenas repletas de improvisos milimetricamente conduzidos pelo diretor.
Ousado? Nem parece.
Assistindo o filme, transparece o quanto os atores parecem confortáveis interpretando seus papéis, e é nesse ponto que Iron Man 2 constrói sua trama voltada aos personagens, de modo que sua interação desencadeie a sempre competente ação pirotécnica realizada pelo diretor Jon Favreau.
Com isso, mesmo que o trailer conte informação demais a respeito da estrutura narrativa utilizada, ainda restam muitas surpresas e inúmeras referências que farão a alegria dos fãs de HQs, que verão a gênese do supergrupo Vingadores desta vez inegável, e não apenas uma menção oculta nos créditos finais.
Muitos talvez questionem o relativamente curto tempo de explosões e pirotecnia apresentado, sem perceber que a fórmula de sucesso das melhores franquias de Hollywood reside exatamente na observância dos aspectos que ligam uma cena de ação a outra.
Essas lacunas são preenchidas com recursos que, se não são originais, conseguem funcionar devido à sintonia entre diretor e elenco, além do roteiro que valoriza os personagens, garantindo tempo de tela suficiente para que cada um seja marcante ao seu modo. É óbvio que alguns obtêm destaque, especialmente Downey Jr, Scarlett Johanson, Don Cheadle, e a atuação estarrecedora de Mickey Rourke, um vilão digno e convincente, cuja estruturação principia nos minutos iniciais do filme e se estende a cada sequência em que aparece roubando a cena, em contraponto ao outro arqui-rival do protagonista, que na interpretação de Sam Rockwell beira o caricato, e só não prejudica o andamento do filme por contracenar com atores que o deixam em segundo plano.
A eficácia da história é demonstrada ainda pela variedade de histórias paralelas bem contadas e coerentes entre si, que vão desde a motivação do vilão Ivan Vanko, à participação da S.H.I.E.L.D., a influência que a existência do Homem de Ferro desencadeia no cenário político mundial, até o viés de humor-dramático representado pelo ímpeto excêntrico e autodestrutivo de Tony Stark, reservando ainda uma surpreendente cena extra, que foi propositalmente deixada após todos os créditos por ser destinada exclusivamente aos conhecedores das histórias da Marvel Comics.
A escolha dessa e de outras referências aos quadrinhos impede que a totalidade dos espectadores capte todas as informações transmitidas, mas não diminui o divertimento que essa obra proporciona. Afinal, não se trata de uma tentativa de soar cult dizendo que o público não entendeu o que o filme quis dizer, e sim uma ferramenta para ganhar dinheiro, e não há nada de errado com isso desde que seja feito com a mínima integridade e respeitando a inteligência da plateia.
Ainda assim, o ar de despretensão ainda permanece, como se o êxito fosse consequência de um mero brainstorm filmado, do qual muitas boas ideias ainda restam para um óbvio e aguardado próximo filme.
Tendo realizado um filme ação praticamente perfeito, Jon Favreau une-se a Sam Raimi, Brian Singer e Christopher Nolan, na lista dos melhores diretores de adaptações quadrinhísticas da última década, e deveria servir de referência para a maioria dos pseudodiretores de filmes de ação que ainda acreditam que a qualidade dos efeitos especiais pode compensar um roteiro comum e redundante.
Quanto vale: 1 ingresso e meio.
Homem de Ferro 2
(Iron Man 2)
Direção: Jon Favreau
Duração: 124 minutos
Ano de produção: 2010
Gênero: Ação
3 comentários:
E ouvi muitas pessoas esperando que o filme fosse pancadaria do início até o final dos créditos.
Ainda bem que o referido diretor conseguiu equilibrar tudo sem exageros.
Excelente.
Eu achei que seria apenas um filme similar ao primeiro, mas foi realmente além das expectativas.
Valeu pelos comentários.
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