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terça-feira, 22 de junho de 2010

O CAÇADOR (2008)



Fora dos padrões.
Assim é o novo cinema produzido no oriente.

Apesar das particularidades que caracterizam o que pode ser chamado de um “estilo” oriental de filmar, o que geralmente caracteriza essas produções é o total desapego a convenções ou fórmulas prontas construídas pela experiência de outros cineastas ao longo da história da sétima arte.
Exemplos disso existem aos montes, mesmo que não sejam encontrados em cartaz no cinema perto da sua casa. Mas dentre esses exemplares de alternativas ao que é realizado em Hollywood, um país tem se destacado recentemente.
A ousadia da cinematografia feita na Coréia do Sul é demonstrada muito pela variedade de temas presentes nessas obras, que vão de épicos de guerra ao estilo “O Resgate do Soldado Ryan” (1998), evidenciado por “A Irmandade da Guerra” (2004), até o cinema de monstros, o que é atestado pelo excelente “O Hospedeiro” (2006).


Mas o que é o gênero cinematográfico mais recorrente proveniente desse país é o cinema de ação.
Diretores como Park Chan-Wook e Bong Joon-Ho têm estabelecido uma forma absolutamente própria de contar suas histórias, e o diretor do filme em análise aqui parece seguir a mesma linha.
Porém, apesar de possuir elementos que se assemelham aos trabalhos desses dois diretores, a principal comparação desse ”O Caçador” é com um dos melhores filmes de suspense policial de todos os tempos, que por acaso é oriundo dos EUA.
As convergências com o clássico de David Fincher, Se7en (1995), nesse caso não são evidências de falta de talento ou ausência de criatividade.

O que permanece entre os dois longa-metragens é o clima e forma como a história é construída, praticamente não dando valor à função que os personagens desempenham na trama. Não faz diferença se for herói, vilão, homem, mulher ou criança. Se em um filme americano isso costumeiramente determina se muitas situações serão vivenciadas pelos personagens, nesses filmes mencionados acima isso é totalmente irrelevante.
O roteiro narrado pelo cineasta Na Hong-Jin é uma jornada de tensão ininterrupta, que sem delongas apresenta seu protagonista de altruísmo questionável. Um cafetão ex-detetive de polícia parte em busca de uma de suas “funcionárias”, que desapareceu após ir atender o chamado de um cliente. Até aí, uma sinopse não muito impressionante, eu sei.
No entanto, o que torna a trama interessante não é sua premissa, e sim a forma como é contada.

Não há espaço para tiroteios intermináveis, ou um pretenso mistério fajuto, tentando prender a atenção do público e compensar a incapacidade do desenvolvimento do enredo de fazer isso. É na verdade uma corrida contra o tempo, bastante verossímil apesar de seus recursos de estilização, em que a maioria dos cacoetes do cinema de investigação policial são desconstruídos.
Há quem possa estranhar a estrutura narrativa empregada, que torna tão difícil definir exatamente o que é esse filme. Afinal, não se trata de uma mera caça ao assassino, ou filme sobre serial killer, ou simples ação. É tudo isso, mas não apenas isso, sendo mostrado com uma intensidade que surge como grande destaque da trama.
A atuação da dupla antagônica é tão envolvente que chega a ser algo perturbador, e aliás, essa palavra define muito do que o filme transmite. Se o herói do filme não é um exemplo de caráter, o que dizer do vilão? Completamente desprovido de emoção ou resquício de remorso por seus atos, representa sua insanidade por meio de uma atuação indecifrável e brutal.


As cenas dramáticas, de tortura, lutas, são executadas com frieza e um estranho realismo, criando momentos de absoluta carga visceral, por vezes hediondamente belas em sua violência esteticamente pensada para ser chocante, mantendo ainda assim o interesse artístico do autor.
Isso sem falar que o filme possui uma das sequências de luta mais perturbadoras e incômodas do cinema atual. Na Hong-Jin comanda seu elenco a ponto de não haver modo de visualizar até onde eles estão atuando, e de sequer imaginar que aquilo não é uma filmagem de uma luta real, e que realmente alguém não vá morrer ao fim da cena.
Talvez pareça exagero, mas isso apenas para quem ignorar o fato de que esse conto policial provavelmente não está muito distante do que seria uma investigação real, em que as coisas não ocorrem de acordo com um plano miraculoso de quem a investiga, e que as coisas podem sair errado pra qualquer um, isso sem falar na dificuldade de lidar com questões como a burocracia que permeia a ação da polícia.


Superior à esmagadora maioria dos exemplares desse gênero de cinema produzidos no ocidente, o filme coreano “O Caçador” mostra que não foi sem motivo sua presença na Seleção Oficial em Cannes, e vai pra extensa lista dos bons filmes que não vão passar na Tela Quente.

Quanto vale:

O Caçador
(Chugyeogja)
Direção: Na Hong-Jin
Duração: 125 minutos
Ano de produção: 2008
Gênero: Ação / policial

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