A
época é propícia para os herois.
Refilmem,
concluam trilogias, hexalogias, mas Hollywood quer mesmo aproveitar a
atual possibilidade de encontrar nos requadros o novo atalho para o
bilhão de dólares.
Ainda
assim, muita coisa mudou e o cinema de HQs enfim vai ficando com uma
cara de história em quadrinhos.
As
megassagas, as cores, os recursos narrativos, o que há de fantástico
nas HQs, tudo vai aos poucos tendo sua versão no cinema, e tem sido
extraordinário ver as formas que os cineastas têm encontrado de
trazer um vislumbre disso para as plateias.
Agora,
no entanto, certos aspectos comuns aos leitores de quadrinhos não
necessariamente são apreciados, e portanto não seria agradável
vê-los nos filmes.
Não
que isso importe quando alguma fortuna em bilheteria esteja em jogo.
Ou
seja, não é nada inesperado realizar isso com os filmes do
aracnídeo, especialmente tendo em vista o resultado extremamente
abaixo da expectativa de Homem-Aranha 3, último trabalho de
Sam Raimi no comando da
franquia.
Além
disso, mesmo que certas investidas sejam fracasso e abominação, que
nem no caso do novo filme “Conan: O Bárbaro” (2011), há
exemplos de êxito ao buscar novos rostos para personagens
consolidados frente ao público cinéfilo, e o mais recente é
simplesmente um dos melhores filmes de quadrinhos já realizados, que
responde pelo nome “X-Men: Primeira Classe” (2011).
Então,
o problema não era especificamente o reinício, e sim o quando
realizá-lo, lembrando que foram apenas 5 anos desde que Tobey
Maguire vestiu pela última
vez a desconfortável vestimenta vermelha e azul com detalhes de
teias distribuídos nela.
Difícil
não ter na lembrança o que se tornou um cult nerd da sétima arte.
Assim, a ideia estritamente comercial de reunir uma equipe competente para não deixar de acumular cifras nos cofres da Sony teria de início a rejeição de uma parcela considerável de seu potencial público-alvo.
Para
garantir que o estúdio não precisasse lidar com a presença de um
cineasta de pulso firme devido a uma longa filmografia destacada, a
contratação de Marc Webb
era um acerto sensacional,
afinal, mesmo pouco conhecido do grande público, ele é o
responsável por um filme que prima pela inventividade, e seu “(500) Dias Com Ela” (2009) é
daqueles pra rever sempre que possível.
A
missão dele, então, seria resgatar o espírito de empolgação que
envolve as aventuras do herói, seja nas HQs, ou nas telas, ao mesmo
tempo evitando os bocejos dos espectadores por ter que assistir uma
releitura do que foi várias vezes visto envolvendo a origem e
transformação de Peter
Parker em combatente do
crime.
Nesse
processo, o cineasta consegue alguns bons resultados com o roteiro, que opta por rever os mesmos fatos,
porém, de maneiras diferentes.
Algo
se perde, é verdade, e é claro que é difícil ver no “novo” Peter
Parker a essência de
nostalgia presente no que
Sam Raimi fez ser o
personagem por toda uma década, desde o longa-metragem
Homem-Aranha, em 2002.
Esse
nerd de skate, reagindo ao bullying, causa um estranhamento à
primeira vista, especialmente para quem não estiver acostumado com o Universo Ultimate da Marvel Comics, de onde vieram muitas ideias presentes no longa-metragem.
Quanto ao novo intérprete do heroi, felizmente se trata de um ator que não aceitou o papel apenas pelos dólares que viriam junto com ele.
Após
atuações em produções como "O Mundo Imaginário do Doutor Parnassus" (2009), e “Não Me
Abandone Jamais” (2010),
Andrew Garfield ainda é
muito mais lembrado por ter interpretado o brasileiro Eduardo
Saverin, no sucesso de
David Fincher,
“A Rede Social”
(2010).
Mesmo
assim, somente se este “Espetacular
Homem-Aranha” fosse um
desapontamento monumental para que sua carreira não fosse marcada
pelo nome Peter Parker
de maneira positiva pelos tempos a seguir a este lançamento.
Andrew
Garfield prova ser uma
escolha extraordinária principalmente quando o dom de Marc
Webb em trazer integridade
para as cenas de diálogo e interação entre personagens vem à
tona.
O
diretor demonstra entendimento da alma juvenil do universo do
Homem-Aranha, e basta a
vidinha medíocre de Parker
exigir-lhe trocar algumas
palavras com alguma guria que a certeza surge: Andrew
Garfield é sim o novo
Homem-Aranha.
Diferente
do esperado, mas digno da importância de quem ele
passa a ser assim que a sessão tem início.
No entanto, não é só de interações humanas que o filme se trata, afinal, com muito dinheiro e desconfiança envolvidos no projeto, é esse o momento de estúdio canastrão mostrar as garras.
Assim,
o roteiro escrito pelas mãos de marionete de Steve Kloves, James Vanderbilt, e Alvin Sargent logo nos faz lembrar o porquê do receio quanto a
essa retomada nas aventuras do aracnídeo.
A insistência em interligar tudo de maneira apressada tem seus motivos, mas em grande quantidade (especialmente no processo de busca
de respostas que envolve a parte inicial do longa-metragem), dificulta ao espectador "comprar" os fatos que são apresentados.
Tudo
conectado e fácil, e frequentemente Peter
vai encontrar quem ele
precisa de imediato, acelerando o enredo rumo ao que se espera, ou
seja, o momento de ser super-heroi criado em CG.
O
que faz dessa parte um não-completo suplício é mérito das historias em quadrinhos e do
diretor Marc Webb.
Menciono as HQs, pois quem as lê sabe que não é estranho a elas estas coincidências, e muitas já estavam nos filmes de Sam Raimi, ainda que dessa maneira, o longa-metragem de 2012 padeça de um certo desequilíbrio na prometida abordagem mais realista.
E no que se refere à competência do trabalho do cineasta Marc Webb, é fato que ele novamente emprega sua capacidade na direção de elenco e na
construção de belos minutos de singeleza, que podem estar
em uma sequência de treinamento em um galpão abandonado, ou em uma
tentativa de conversa ridiculamente hilária e brilhante entre
Peter e seu interesse
romântico Gwen Stacy.
Até
porque, a química entre Andrew
Garfield, e
Emma Stone (a atriz que
interpreta Gwen)
é formidável.
Marc
Webb e a dupla de atores
criam as melhores cenas do filme com diálogos e sutileza.
E
é importante salientar que não apenas eles estão muito bem no que
se refere ao elenco, e tanto Dennis
Leary (Capitão
Stacy), Rhys
Ifans (Doutor
Curt Connors, ainda que
pouco aproveitado na trama), se saem bem, mas é evidente que existia
muita curiosidade sobre a participação de Martin
Sheen e
Sally Field, afinal, eles
são nada mais nada menos que Ben
e May
Parker, a família que
resta a Peter
quando seu pai (interpretado por Campbell
Scott) e mãe (na atuação de Embeth Davidtz)
o abandonam.
Quanto
à tia May,
sua parcela de tempo no filme e atenção conferida pelo roteiro é
reduzida, e ela fica longe do que se esperava, mas Ben
Parker é um destaque em cena sempre
que Martin Sheen tenta
ser a voz paternal para o protagonista, e a cena envolvendo-o, e que irá
redefinir os rumos da vida de seu sobrinho é especialmente mais
sombria e forte que na leitura feita por Raimi em 2002 (apesar de a versão anterior ser fidelíssima aos quadrinhos, diga-se de passagem).
O
longa-metragem no geral é mais sombrio que a proposta de
Raimi, com várias cenas à
noite, e obviamente o vislumbre mais realista que era prometido nesse
filme de 2012, que funciona com a exigência de diferenciação em
relação à paleta de cores vinda das HQs, vista nos longa-metragens
antecessores.
É
perceptível, assim, o esforço do diretor em traduzir nas cenas o máximo de emoção e
dramaticidade, e ele consegue ao
elaborar no desenvolvimento de personagens e sequências de ação
algo que valha assistir, e certamente prepara caminho para um
logicamente confirmado próximo filme.
Nesse
sentido, ele também tem pontos positivos por apresentar elementos
que os fãs sentiram falta na leitura cinematográfica anterior, com
destaque para o lado humorado apresentado pelo vigilante mascarado e
a adição dos lançadores de teia.
Na
movimentação do herói, é notório que os efeitos especiais
resultaram em um produto visualmente mais interessante. Isso não
chega, no entanto, a ser algo impressionante para os padrões atuais. Apenas funcional, e o
mínimo, pra falar a verdade em se tratando de um blockbuster de
tamanho orçamento.
Ninguém,
aliás, duvidava que nos aspectos técnicos a produção seria menos
do que impecável,
A
dúvida sempre esteve na capacidade de superar a afetividade ainda
existente com as adaptações anteriores, o que resultou em inúmeras
críticas quanto ao na época ainda não lançado trabalho de
Marc Webb.
Na
comparação, é evidente que a coesão que o nerdismo quadrinhófilo
de Sam Raimi trouxe para a trilogia original (ao menos no primeiro filme e principalmente em Homem-Aranha 2)
faz falta a esse novo longa-metragem, que além de um roteiro em
vários momentos preguiçoso, sofre visivelmente com as várias refilmagens pelas quais passou.
A sensação de que as cenas não estão dispostas necessariamente da maneira que o editor gostaria se o material não houvesse encarado essas dificuldades nos bastidores persiste em inúmeras sequências, e o desenrolar da trama prossegue sempre mostrando boas ideias e momentos dignos de elogios ao diretor, que podem ser forçados ao esquecimento no minuto seguinte pela necessidade de resumir o excesso de interesses do estúdio, mesmo que seja logicamente um equívoco ignorar o que há de positivo no filme.
Talvez
se fosse menos pretensioso no que foi vendido ao público pelo
marketing, essas limitações não fossem tão preocupantes,
especialmente porque, a maior promessa era da revelação
do episódio envolvendo os pais de Peter
Parker, algo que é
descuidadamente relegado desde sempre a ser um “gancho” para o
futuro da trilogia.
Um
gancho muito ruim, insisto em salientar, especialmente após assistir a inútil cena pós-créditos.
Com
todo o peso que havia sobre as costas de Marc
Webb, o controle que ele
tem sobre as cenas de interação entre o elenco engajado é peça
primordial para conquistar a empatia da plateia no que diz respeito a
esses novos rostos e motivações que irão ser o centro da jornada
do herói que se inicia agora.
Motivações
diferentes, origens diferentes, mas com a aura de entretenimento
afiada, trazendo na comicidade novamente uma característica
importante, compensando muitos erros que estavam além da pouca
influência de Marc Webb em
Hollywood conseguir evitar.
Assim, o longa-metragem é bom no que se pede dele, ou seja: um filme de origem, tendo que consolidar a imagem do novo intérprete frente ao público, garantindo assim sobrepujar a rejeição à ideia de reboot, e logicamente somar uma quantia digna de arrasa-quarteirão para garantir que a nova empreitada teria fôlego para uma futura trilogia.
Assim, o longa-metragem é bom no que se pede dele, ou seja: um filme de origem, tendo que consolidar a imagem do novo intérprete frente ao público, garantindo assim sobrepujar a rejeição à ideia de reboot, e logicamente somar uma quantia digna de arrasa-quarteirão para garantir que a nova empreitada teria fôlego para uma futura trilogia.
Esse reinício do aracnídeo é,
além de tudo, diferente do que se esperava dele, e aceitar isto é
algo imprescindível para aproveitar a produção, que se não está
à altura da errônea expectativa de ser o que
Homem-Aranha 3 deveria ter
sido, não faz feio quando se leva em conta que esse é um filme de
origem, com todas as dificuldades que estão vinculadas a isso.
Para
um recomeço, O Espetacular
Homem-Aranha se
sai bem, afinal, simplesmente conseguir que Andrew
Garfield tenha se tornado
um Peter Parker convincente
já é um saldo bastante positivo, e a garantia de uma nova franquia a qual é certamente bem-vinda.
Quanto
vale: Meio Ingresso e uma porção de pipoca.
O
Espetacular Homem-Aranha
(The Amazing
Spider-man)
Direção:
Marc Webb
Duração: 136 minutos
Ano
de produção: 2012
Gênero:
Ação/Aventura
7 comentários:
Achei também o tom do filme mais sombrio, mesmo, mas no resultado geral gostei. É uma boa história de origem. Certamente esse filme terá uma sequência.
Aliás, o primeiro semestre de 2012 foi permeado com bons filmes de super-heróis, mas o destaque do ano quando o assunto é gente de grandes poderes vestindo roupas coloridas se chama Os Vingadores.
Com certeza absoluta, Os Vingadores é um patamar elevado quando se fala em blockbuster.
Este Espetacular Homem-Aranha acaba em um meio termo entre o aspecto quadrinhesco dos Avengers, e o realismo soturno do Batman de Christopher Nolan, e até por essa indecisão quanto ao tom da trama, por vezes é voltado a essa busca por realismo (ainda que em um universo fantástico) e em outros momentos lida com as limitações do roteiro trazendo saídas fáceis típicas das HQs mensais não tão memoráveis por seus roteiros, muitas vezes, para levar o enredo adiante.
Ainda assim, Marc Webb conseguiu um trabalho consistente, e mesmo longe do épico Avengers, iniciou com o pé direito a nova trilogia do Spider-man.
Agora é esperar, porque o futuro das franquias mencionadas acima, e o que a Warner prepara com os herois DC promete arriscar vôos ainda mais ousados.
Eu curti pacas o Spider-Man novo cara.
Discordo litros da tua análise.
Sinceramente, gosto do Raimi, mas por mais que seja birra com estúdio, ou qualquer outra coisa que seja, a cagada imensa no terceiro filme deve sempre ser lembrada. Foi ridículo aquilo tudo.
O segundo homem aranha da sua trilogia realmente é muito massa, mas acredito que por mais que esse novo apresente erros, se equipara tranquilamente com o melhor feito por Raimi alguns anos atrás.
Abraço,
Que bom que tu curtiu o filme.
Eu me diverti bastante também, mas infelizmente, entre uma baita cena e outra filmada pelo Marc Webb, sempre aparecia uma coincidência absurda, ou a sensação de corte de edição remediador (inclusive, é bem fácil reparar cenas que estavam nos trailers e não constam na versão final do filme).
Quanto ao fator diversão, até pode ser que Spider-Man 2 e Amazing Spider-Man tenham proximidade, mas no trabalho do Raimi a narrativa funcionava sem ficar empacando a cada dez minutos nas coincidências.
Um tipo de blockbuster poucas vezes visto.
É bem difícil um filme de origem conseguir se equiparar a um segundo filme.
Mas reitero, que legal que tu curtiu o filme.
E a propósito, comparar com o terceiro filme foi covardia. Se Spider-Man 3 já estava aquém do esperado, quase nada se salva quando a franja do Peter aparece em cena.
Massa.
Sinceramente, não percebi essas amarras de roteiro velho.
Mas pretendo reassistí-lo em breve, dessa forma, vou cuidar e analisar com mais detalhes.
De qualquer forma, concordo com a análise em partes, mas, pô...
Valeu um ingresso velho! heheheh
Abração!
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